pais e filhos

Quando filhos cuidam de seus pais idosos.

Chega um momento da vida onde nós, filhos adultos, cuidamos dos pais idosos. Perdi minha mãe muito cedo. Foi uma “morte súbita”, aos 67 anos, o que chocou a família inteira pelo inesperado da coisa – considerando uma mulher que estava em plena atividade. Mas, a vida é assim – não se pode prever até quando estaremos por aqui. Naquele mesmo ano, tínhamos comemorado o aniversário de 70 anos do meu pai e ele seguiria viúvo por mais 20 anos. Durante esse tempo, ele teve boa saúde e viveu com  independência, mas, em 2011, sofreu um AVC isquêmico que mudou a vida dele de maneira irreversível.

Experiência própria

Faz pouco tempo, a medicina não tinha os recursos de hoje quando grande parte dos problemas de saúde comuns ao envelhecimento podem ser controlados com medicação – embora nem sempre com a qualidade de vida ideal. Isso coloca os próprios filhos na linha de frente, assumindo cuidados de mãe ou pai, numa inversão total de papéis. A experiência de cuidar do meu pai me ensinou muito sobre envelhecer.

Meu pai nasceu em 1926, era dentista, foi atleta e praticou várias modalidades de esporte: o remo quando jovem, o vôlei com um grupo de veteranos no clube e mais tarde o tênis, que ele só deixou de praticar aos 82 anos.

Depois disso, mais sedentário, sem o convívio social com os amigos do clube e viúvo há vários anos, a saúde começou a declinar. Aos 85, ele sofreu uma isquemia que afetou a comunicação – uma afasia de expressão embaralhou as palavras. Dali em diante, ele teve “o próprio idioma”, um misto de palavras corretas com outras impossíveis de se entender. Apesar disso, quando faleceu aos 90 anos de idade, ele se mantinha bastante forte, com a postura ereta, resultado da prática regular de exercícios físicos.

Depois da isquemia, meu pai viveu por 5 anos com dificuldade de comunicação, o que pôs fim à independência dele. Foi preciso criar todo um sistema de apoio para que ele ficasse em segurança e bem atendido, principalmente, que ele se sentisse cuidado e amado.

Meu pai e eu
Meu pai e eu (2016)

Ninguém nos prepara para cuidar dos pais.

Não somos preparados para a perda da saúde e da autonomia dos nossos pais e, ao mesmo tempo, eles que sempre cuidaram de nós, se sentem desconfortáveis com a própria vulnerabilidade. Um simples banho vira “evento complexo” assim como os deslocamentos para consultas médicas ou um simples passeio para pegar sol. Um pacote difícil para os dois lados.

Tive depressão com a doença do meu pai que aconteceu simultaneamente a minha entrada na menopausa. Quanto mais ele ia precisando de cuidados e atenção, a ansiedade ia me esganando. Nos últimos dois anos de vida dele, usei um antidepressivo leve que me ajudou a lidar com tudo, a dormir melhor e me sentir mais tranquila.

Já se passaram anos que ele se foi e hoje vejo primos e amigas às voltas com muito daquilo que eu vivi cuidando do meu próprio pai. Situações difíceis, problemas e decisões dolorosas nos ocupam, dias e noites. É um misto de tristeza e saudade antecipada de alguém que não vai estar conosco em breve, e para sempre.

O exemplo ensina

Meu pai chegou aos 90 anos, em grande parte, pelo estilo de vida que teve. Além da prática de esportes, bebia um choppinho lá de vez em quando e se alimentava com parcimônia (um termo muito usado por ele). Cultivou um corpo forte o quanto pôde. E o cérebro também.

Lembro dele comendo abacate e amendoins por terem vitaminas que davam longevidade. E dos livrinhos de sudoku, do cubo mágico que ele resolvia fácil, dos quebra-cabeças complicados que tinha prazer em desvendar e dos trabalhos em marcenaria (utensílios, móveis e miniaturas) – eram todos exercícios para o cérebro.

Não temos como saber o que o futuro nos reserva, até onde iremos e como chegaremos lá. Mas, cultivar um estilo de vida saudável, de corpo e mente, ajuda bastante!

Amor e paciência

Amor e paciência são indispensáveis quando se embarca na “montanha russa de emoções” que é cuidar dos nossos pais velhinhos e doentes. Abraços, beijos, carinhos, muitas e muitas fotos de recordação. É uma sede por eles com vida! Não queremos perder a chance de estar junto, mesmo que, em alguns casos, já não haja tanta lucidez e eles nem saibam que estamos ali.

Vez ou outra, a gente até perde a paciência, depois se arrepende. Dar conta de tudo sufoca. Como se todos os dias fosse preciso “matar um leão“, às vezes, uma alcatéia inteira, sozinha. A exaustão bate, a cabeça pira. Aí, a gente para, respira, volta pro corpo, e retoma a dança. É fundamental tratar os velhinhos com carinho – sem esquecer de cuidar de nós mesmos. É hora de estar presente, dar amor e cuidado pra quem merece muito.

“Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe”. Provérbio português.

Isabel Cavalcanti Juchem

Isabel Cavalcanti Juchem

Sou publicitária, aposentada, 60+, e falo aqui sobre envelhecer mantendo o espírito jovem.

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